Comentário da reportagem “Sobra falta de qualificação” publicada no Jornal Estado de Minas, caderno de Economia, em 26 de out. de 2012, p. 19.
O cenário econômico nacional vem apresentando índices de desemprego baixos, apesar do momento de crescimento econômico fraco e indústria em crise. É surpreendente saber que a região da Grande Belo Horizonte tenha gerado quase 5 mil novos empregos somente no mês de setembro e ainda apresentado um decréscimo de 6,98% na taxa de desemprego comparando-se os meses de agosto e setembro de 2012. Tais dados não combinam com uma economia que cresce pouco.
Para entender esta situação é importante notar que nem todos os setores da economia brasileira estão passando por dificuldades. Na própria indústria de transformação, enquanto os segmentos de bens duráveis e bens de capital estão em queda livre, a produção de bens de consumo não duráveis tem, de alguma forma, se mantido. A construção civil é grande empregadora e continua crescendo. A maior parte dos segmentos do setor de serviços, o qual detém grande capacidade geradora de emprego, está aumentando a produção. Enquanto continuar crescendo, mesmo que a taxas pequenas, continuará gerando novos empregos.
É notório que é o consumo das famílias que está garantindo o crescimento da economia no Brasil. Portanto, forma-se aí um ciclo virtuoso de geração de emprego e renda e consequente manutenção da demanda por parte das famílias (consumidores), gerado essencialmente pelo endividamento facilitado pela fartura de crédito no mercado.
Não se trata necessariamente do pleno emprego da mão de obra, pois para tanto toda a população economicamente ativa (PEA) deveria estar empregada, o que não ocorre atualmente, sobretudo em momentos de grave crise econômica mundial.
Observa-se que as taxas de desemprego possuem um forte componente sazonal, com elevação no início do ano e queda no final. Portanto, espera-se novas reduções até dezembro, em virtude do alto nível de contratações temporárias para o fim de ano. Com relação ao futuro, as perspectivas são duvidosas. Em primeiro lugar, é pouco provável que ela continue caindo nos próximos anos, até porque já atingiu níveis muito baixos. Por outro lado, as incertezas sobre a economia internacional são enormes. Mesmo beneficiada por possuir um grande mercado interno, as possibilidades de crescimento da economia brasileira no futuro próximo são limitadas tendo em vista o atual cenário externo.
A desqualificação do trabalhador também possui papel de destaque nesta discussão. A questão da falta de mão de obra preparada está mal colocada na discussão que ocorre no país sobre o tema. Fica-se com a impressão que se trata de um problema generalizado, quando na realidade não é.
Indicadores econômicos mostram que a imensa maioria dos empregos gerados referem-se a empregos de baixa qualificação e baixos salários (assistentes e auxiliares administrativos, ajudantes de obras civis, alimentadores de linha de produção, operadores do comércio, trabalhadores nos serviços de manutenção de edificações, trabalhadores de carga e descarga de mercadorias, recepcionistas, vigilantes e guardas de segurança).
A questão é mais pontual do que generalizada. Algumas ocupações, como enfermeiros e técnicos de enfermagem, técnicos em eletrônica, analistas de tecnologia da informação e alguns tipos de engenheiros e professores, entre outras, têm apresentado forte demanda e muitas vezes não se encontra profissionais aptos a ocuparem estas vagas. Ocupações estas com capacidade de agregar mais valor ao trabalho e que futuramente, graças a sua escassez, poderão deixar o mercado em colapso. Este é o principal problema.
O paradoxo existente entre a desqualificação da mão de obra e o baixo nível de desemprego, explica-se pelas grandes transformações estruturais ocorridas na economia brasileira nas últimas décadas. Pois cada vez mais a economia vem se voltando para o setor terciário, com queda relativa da agricultura e da indústria. De qualquer forma, o crescimento relativo do setor terciário no PIB significa uma maior capacidade de absorção de mão de obra por seu menor nível médio de produtividade, podendo explicar em parte as baixas taxas de desemprego encontradas atualmente no país.
A falta de qualificação da mão de obra pode ainda trazer a baixa capacidade em realizar as tarefas a contento. Apesar da crise internacional, o ritmo de atividade de muitas empresas não parou. Aquela velha fórmula de formar a mão de obra via treinamento interno, tendo paciência para que o profissional atinja elevado nível de desempenho, ainda tem espaço. Mas é um processo lento que não atende às necessidades imediatas das organizações e do mercado.
Observo que, salvo raríssimas exceções, só há desemprego para aqueles que não estão devidamente preparados. Se de um lado a tecnologia cresce na velocidade da luz, de outro a mão de obra desqualificada será um grande impeditivo para o Brasil possa efetivamente crescer de maneira sustentada. Planejar a carreira, aperfeiçoar, desenvolver habilidades, exercitar o senso coletivo, cuidar das competências emocionais, são quesitos mínimos para o sucesso.
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