O contraste da bolsa - por Míriam Leitão
A queda de 8% do Ibovespa está em contraste com a projeção de alta de 3% do PIB. A aceleração da economia deveria impulsionar as ações, mas o índice caiu abaixo de 55 mil pontos esta semana, o menor patamar desde julho. Grandes empresas perderam valor. A Petrobras cai 5% e já chegou a cair 15%. A Vale despenca 17%. O grupo X está em xeque: OGX, -45%; MMX, -48%; MPX, -13%; LLX, -9%.
O primeiro trimestre chega ao fim com a bolsa no vermelho e isso é mau sinal. Os investidores, quando estão confiantes num ritmo mais forte de crescimento, tentam antecipar a tendência com maior movimentação de negócios e compra de ações. Crescimento gera lucro. Segundo o economista Álvaro Bandeira, da Órama Corretora, esse resultado está surpreendendo porque outros mercados estão em alta, inclusive na América Latina:
- Ninguém imaginava, há seis meses atrás, que se pudesse ter o Ibovespa no negativo com as outras bolsas do mundo em alta. Ninguém previa esse descolamento. Achávamos que o Brasil acompanharia o cenário internacional. Até as bolsas da Europa, foco da crise, estão com desempenho melhor que o nosso.
Os índices americanos sobem forte no ano e alguns quebraram recordes. O Dow Jones tem alta de 10%; o S&P, 9,3%; Nasdaq, 7,7%. Na Europa, a bolsa da Irlanda sobe 15%. A da Inglaterra, 10%. O principal índice da Alemanha, o DAX, sobe 2,4%; o CAC, da França, sobe 1,5%. Até mesmo as bolsas da Itália, Grécia e Espanha, que estão no vermelho, têm quedas menores que a nossa. Grécia cai 6,4%; Itália, 5,6%; Espanha, 3,2%.
Para tentar entender o que aconteceu, portanto, é preciso olhar para problemas internos, não dá para culpar a crise internacional. Segundo Álvaro Bandeira, uma parte da explicação está na mudança do olhar de investidores estrangeiros sobre o Brasil. Depois de um longo período surfando no bom momento, o país perdeu atração em relação a latino-americanos, principalmente México, Chile, Colômbia e Peru.
- O Brasil já tem dois anos de baixo crescimento com inflação alta. Há outros emergentes em situação melhor, inclusive na América Latina. Se olhar para a Ásia, nem se fala. Além disso, houve mudanças regulatórias em vários setores ao mesmo tempo, o que aumentou a insegurança. O setor de energia não é mais das viúvas, no sentido de que era considerado de proteção para fundos de pensão internacional. Virou setor de alto risco.
A análise setorial diz muito. O setor de petróleo e gás ficou cinco anos sem rodadas de licitação. A Petrobras sofre influência política; e a OGX vive momento de desconfiança sobre sua gestão. Isso derruba outras ações do grupo de Eike Batista. Na mineração, o preço do minério de ferro está abaixo do recorde e há incertezas regulatórias. O governo estuda subir a taxação sobre a exploração.
A aviação civil tem problemas no mundo todo e aqui houve aumento de custos pela desvalorização do real. A construção civil está arrumando a casa, depois de um forte período de lançamentos. As três maiores construtoras com peso no Ibovespa estão em queda. A MRV cai 29%; PDG Realty, 5%; Cyrella, 7%. A siderurgia vive um cenário ruim desde 2008, porque há sobra de aço no mundo. As ações da Gerdau caem 14% no ano, a Usiminas cai 15%.
Até empresas ligadas ao consumo, que tiveram desempenho espetacular, como a Ambev, estão com ligeira queda. Ela subiu mais de 400% desde março de 2009. Este ano, cai 1%. A Hypermarcas cai 0,7%. O aumento do endividamento das famílias é um entrave para que se mantenha o ritmo. Bandeira chama atenção para a queda na concessão de crédito a pessoas físicas em fevereiro, divulgado pelo Banco Central.
Há explicações setoriais, mas o fato é que o desempenho da bolsa como um todo desafina nessa expectativa de uma economia mais aquecida em 2013.
Fonte: http://oglobo.globo.com/economia/miriam/. Acesso em: 28/03/2013.
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